Sentados em volta da mesa. Uma vela acesa no meio. Luzes apagadas, janelas fechadas. Conversamos.
Ricardo diz que uma das coisas que ele mais gosta no teatro é o tanto que se troca com alguém em cena. Essa partilha de uma intimidade que abrange um outro pedaço da vida. Uma cumplicidade de uma outra ordem, que diz respeito a um outro tipo de relação. Não necessariamente melhor ou pior que a da vida ordinária, mas diferente.
Mariah levanta da mesa e vai buscar alguma coisa em sua bolsa. Ricardo não entende a atitude de Mariah, fica até um pouco ofendido, está falando sobre algo que lhe é muito caro, meu deus.
Mas ele não parou de falar. Completou que, nesse trabalho, esse mesmo da casa, ainda por cima estamos indo muito em nós mesmos, compartilhando muito do que é nosso. Se embaralha um pouco com a fala, Mariah voltou, ela tem uns papéis na mão, Ricardo termina dizendo que já sente uma coisa muito forte por todos ali.
Mariah lê. Apenas lê. E diz tudo que precisava ser dito. Diz que comunicação é sempre amor, não tem outro meio. E amor é sempre acompanhado por confiança, confiança de que o outro é capaz; porque o outro sou eu. Se o outro é capaz, eu também me torno capaz. Isto é o oposto de paternalismo, patriarcado, capitalismo. É a liberdade. Quando eu posso receber o outro, então estou comunicando; quando eu escuto o outro e sei que posso falar também. Estes momentos não acontecem todos os dias porque estamos inseridos em fortes estruturas de poder e opressão – estão ao nosso redor, por dentro, por toda parte. Vivemos num mundo que não quer que sejamos tocados porque se formos, nos tornaremos poderosos e capazes de mudar as coisas. Teatro político é portanto qualquer teatro voltado para esta noção básica de respeito aos seres humanos como iguais. E estar sempre em movimento porque nada está de fato completo e finalizado. O ator finge que finge. E este texto foi escrito para ser jogado no mar.
Não há mais nada a ser dito, pois. Apagamos a vela. Escuro.
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